A água cura
Claudia Silva Jacobs
11/12/2017 11h12
Francisco (sem boia) em Mangaratiba. Foto: Claudia Silva Jacobs
Achar opções não é fácil. Tem barulho, muita gente, fila grande. Sempre tem alguma dúvida em torno das escolhas de programação com o Chico. Ele não gosta de novidades, reclama quando sai do modus operandi. Demoramos, mas entendemos que tem um fator, onde quer que seja, que é agregador e funciona como uma espécie de calmante. Seja salgada, doce, calma, agitada. Onde tem água, tem solução. Cada vez mais eu vejo exemplo de total interação entre autistas e o mar. Recentemente, vi uma reportagem em que um menino na Austrália fazia mergulhos espetaculares, a única coisa que o mantinha calmo. Emocionante a história.
Eu descobri isso. Francisco é capaz de ficar horas no mar, sem boia ou ajuda, apenas contemplando a calma ou mesmo as ondas, nadando levemente, sem mesmo ter aprendido a nadar. Não precisou de ajuda ou professor. A relação foi estabelecida automaticamente. E essa relação se estende as piscinas, cachoeiras, é só ter água corrente. Até mesmo no Aquário a relação foi surpreendente. E foi assim no último domingo. Pela primeira vez no Parque Madureira (parque no subúrbio carioca), chegou irritado após mais de meia hora no carro. Caminhou no parque, reclamou, gritou, mas tudo se acalmou e o sorriso surgiu. Embaixo dos aros olímpicos presenteados por Londres e instalados no Parque, uma queda d'água é a alegria das crianças. E foi o melhor calmante para o domingo de Chico. Sentou nas escadas, sorriu, brincou. Parece um sonho. Voltou para casa feliz e contente.
Francisco no Parque Madureira. Foto: Paul Jacobs
Fiquei pensando sobre essa relação. Como as coisas podem ser mais simples, como precisamos de água para sobreviver. Acho que os autistas entendem isso muito bem e mostram como precisamos lembrar todos os dias que a água é a base de tudo, nossa essência. Parece que Chico tenta nos mostrar que o caminho é mais fácil do que estamos sempre buscando. Será ?
Sobre o autor
A jornalista Claudia Silva Jacobs atua na profissão há 31 anos, tendo passado pelas redações dos jornais O Globo, Jornal dos Sports e Jornal do Brasil, entre outros. Em 1998, mudou-se para a Europa, onde trabalhou por seis anos na BBC, em Londres. Participou de diversas coberturas e ganhou o prêmio Ayrton Senna de reportagem de rádio com a série Trabalho Infantil no Brasil. O tema inclusão passou a fazer parte do seu dia-a-dia ao descobrir que o filho mais velho Francisco, hoje com 13 anos, era portador do espectro autista. De lá para cá, vem participando de debates, campanhas e escrevendo artigos variados sobre o tema. Está em fase de conclusão do portal cidadaoautista.
Sobre o blog
Um espaço para se discutir a relação com pessoas portadores de deficiências, quebrando pré-conceitos e a falta de informação. Um lugar para se falar de curiosidades, amenidades e formas de convivência que podem ser valiosas para todos.